quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

(pássaro cativo)


                                                    
quem vem de lá
vem montado no sol
com a alma em transe e os olhos no infinito

                                                                
na força do deserto
os caminhos não se repetem
e eu cultivo areia e espanto

                                                             
preso ao teu olhar
deixo-me levar pelo azul da paisagem
pássaro cativo, só canto

(sempre assim)


em linhas gerais
leio nas entrelinhas
tento a sorte
no jogo de azar
prevejo o futuro
nas conchas do mar
                                                      
ganho a vida olhando as estrelas
piso chão de nuvens e sonhos
                                                   
sempre assim
o céu e o mar
o bem e mal
açúcar e sal
coração dizendo sim
amor do princípio ao fim

(mar sugerido)


                                        
o azul nas margens
(epifania das cores)
compondo mistérios
                                       
o sal dos sussurros
(mel da ansiedade)
ajuizando ruídos
                                                
mar sugerido
barco tonteando na chuva
horizonte perdido
                                                      
nas noites mal dormidas
uma flor abortada
sonega os sonhos
                                                              
o barco fantasma
naufraga em mim
(soluço e solidão, totens da madrugada)


(mera quimera)


a insônia estica o tempo
                              
aí o rio não corre
o tempo não voa
a vida não morre
só o silêncio ecoa

                          
bruta ilusão
desenhada em traços ligeiros
coloca o homem em uma ilha

                              
recarrego os sonhos
e vejo estrelas peregrinas
em uma linha carregada de cores
e a última lua no buquê de flores

                               
mera quimera
o azul do teu sorriso
no branco da tela.

(a rosa de Paracelso)

- um pequeno sol -


para J. L. Borges

evocando falsas memórias
o ouro perdia-se no tempo
as palavras ganhavam peso
ao ocultar-se nas histórias

                                                   
o que fazer do conhecimento
quando a alma se esvazia?
os símbolos não geram poder
pois o poder é nulo de sentido
é como o sol que não aquece
é a fé fria no coração partido

                                                        
avivo o fogo e crio
das cinzas o encanto
do carbono a rosa

terça-feira, 26 de novembro de 2019

(coração aos berros)

                                                               
impossíveis asas ousam céus azuis
                                                         
meu coração
aos berros
não muda
a geografia do teu mundo

                                             
apenas simula o sol
na transparência do som

                                               
cacofonia cataclismo
protofonia do abismo
                                                   
(José Carlos de Souza)

(nas nuvens)

                                          
baixa
o poema
nas nuvens

                             
canta
uma canção
vulgar

                             
carrega no ar
a ilusão
de ser livre

                               
/apenas
uma questão
de ótica

                                
ou
uma forma
de se libertar?/

                                                 
(José Carlos de Souza)

(labirinto)               

                                  
sonhando punhais
salto das nuvens
montado no sol

                                                                
dos oráculos crio labirintos
como quem reprisa o sorriso de Mona Lisa
Quixote, divino lunático, sibila errante
e eu me abismo em absinto

                                                                      
sigo em rota batida
escusando-me das balas perdidas

                                                                     
Tirésias proclama
nossa triste condição humana

                                                                
nesta selva confusa
minha alma berra
meu coração clama

                                                  
(José Carlos de Souza)

(chilam balam)

                                 
a luz da distância
nos fala do tempo

                                  
os nós da memória
contados nos dedos

                                 
oráculos temidos
desdenham da fé

                                    
são limpos os pés
e as mãos do silêncio

                                     
(José Carlos de Souza)

(águas narascas)


usina de mundos
o mar em minha casa
um aquário em minhas veias

                                                  
tanto céu fingido
corrobó-conetar banhou o sol
em águas narascas

                                                
nasce o tempo sem medidas
no chão duro da memória

                                                           
o infinito maturado em anseios
divide a vida ao meio

                                                                                                          
(José Carlos de Souza)

(canícula feroz)


ao meio-dia
o sol bebeu as nuvens

                                                      
canícula feroz
faz ferver o chão das nossas causas

                                                                  
o vento traz o mormaço
e um silêncio de gravetos calcinados

                                                              
tudo cheira a sol
do mato ao gato, da pele ao lençol

                                                                
sorrateira sonatina das cacimbas

                                                             
a seca riscando às cegas
punhal veloz marcando a vida


quinta-feira, 11 de julho de 2019

(absurdo cotidiano)


o absurdo
multiplica as incertezas.
as vozes se revezam
entre o grito e o silêncio.
a noite fica na linha
que demarca o medo.


o coração pede
um pouco de sombra.


(José Carlos de Souza)

(povo sem voz)


na selva cidade
a fina palavra vida
espetada na ponta da língua


e um imenso nó na garganta
amarrando a fala.


(José Carlos de Souza)

(com o sol na garganta)


o sertão não é metáfora
é vida marcada a ferro e fogo
rusticidade que desafora


quando a seca dá as caras
faz serão anos a fio
demora de ir embora


com o sol na garganta
mãos amarradas ao destino
o sertanejo resiste aos desafios


o olhar plantado na terra nua
vê o sol forjar imagens
criar rios de miragens


seguindo a sina nordestina
juntos cantamos ladainhas
juntos seguimos procissão


(José Carlos de Souza)

(desalinho)


os segredos das marés
ressoam na praia
onde pés e barcos encalham


com estrelas nos olhos
e o céu nos cabelos
vejo o sol naufragar no horizonte


agora é a noite
que alimenta o caos


(José Carlos de Souza)

(absinto e bourbon)


eu bebo os abismos
com sede colossal
odeio meio-termo
receio meio-tom
quero o copo cheio
de absinto e bourbon.


dentro de mim
o destino é teia
de cabalísticos nós.
ao meu lado
um deus passeia
e eu me sinto só.


na verdade eu não passo
de um velho rio assoreado
correndo contra o tempo.
velhas pegadas
resumem o que fui
traduzem o que sou.


(José Carlos de Souza)

quarta-feira, 10 de julho de 2019

(antes do mundo acabar)


antes do mundo acabar
vou fazer um poema
com gosto de samba
feito em mesa de bar


vou gravar sua voz
pirografar seu nome
transformar eu em nós
no fogo que nos consome


antes do mundo acabar
toda lua será de mel
toda estrela terá seu céu
nenhuma paixão será vulgar


vamos transformar o mundo
alquimia que nos faz sonhar
transmutar o ouro do amor
na pomba branca da paz


(José Carlos de Souza)

(versos na surdina)


não pense você
que eu estou num beco sem saída


minha alma em alerta
é uma porta aberta
para o infinito


brotando da fé do imaginário
criando versos na surdina
cortando as cartas do baralho
me sinto dono da minha sina


na corda bamba
no fio da navalha
meu corpo se equilibra


moldando o sol em silêncio
com as mãos de fino artista
fiz nascer um mundo novo
mais humano, mais altruísta


(José Carlos de Souza)
"se você
ligar agora
e me falar de amor
você vai
simplesmente
estar ligando sonhos"

(fio da paisagem)


danço na sombra
ao som dos ventos
e quando venho à luz
venho com os olhos sonolentos
no fio da paisagem


vejo corcéis desembestados
deixando em suas pegadas
falsos sinais
e no voo cego dos lamentos
surge a rima em sóis matinais


em linhas gerais
leio as estrelas
e escrevo nas entrelinhas
o que é óbvio e oculto
sentimentos reais


(José Carlos de Souza)

(ruminações)


a paixão pelo deserto
todo ser humano tem


alguns mais outros menos
o certo é que todos temos


segredos dispersos

por certo

secretas ruminações

(José Carlos de Souza)

  (simulando razões) esse jogo de máscaras  esconde esgares congela o voo tudo para que  o caos se faça na pele enrugada da tarde para que u...